Na foto, Lindomar Terena durante fala no Fórum da ONU, em Nova York
Assessoria de Comunicação, Cimi
As violações de direitos humanos e territoriais dos povos indígenas no
Brasil foram denunciadas à Organização das Nações Unidas (ONU) nesta
terça-feira, 20 de maio, durante a 13ª sessão do Fórum Permanente da ONU
sobre Questões Indígenas, realizado na sede da Organização em Nova
York.
Lindomar Terena, indígena de Mato Grosso do Sul e representante da
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), falou sobre as
iniciativas de setores da sociedade, principalmente da bancada ruralista
do Congresso Nacional, para aprovar mudanças nos direitos
constitucionais indígenas.
“Está em curso no Brasil uma série de articulações e iniciativas que
buscam a reduzir, suprimir os direitos dos povos indígenas, reconhecidos
pela Constituição Federal Brasileira e reafirmados por tratados
internacionais. [...] O modelo desenvolvimentista brasileiro objetiva
disponibilizar os territórios indígenas, e de outros segmentos e
comunidades tradicionais, para a exploração descontrolada dos bens
naturais, a expansão do agronegócio e a implantação de grandes
empreendimentos. [...] Para tanto, o Governo brasileiro paralisou o
processo constitucional de demarcação de nossos territórios, aumentando
gravemente os conflitos territoriais em várias regiões do Brasil”.
Leia o discurso na íntegra:
Senhora Presidente, demais parentes indígenas de todo o mundo
A organização que represento, chamada Articulação dos Povos Indígenas do
Brasil - APIB, reúne organizações regionais indígenas e de base dos 4
cantos do Brasil, atua na defesa dos direitos e da vida de mais de 300
povos, falantes de 270 línguas. Apesar de sermos 1 milhão de indígenas
que sobreviveram a grande invasão de 1500, ainda hoje, representamos 1/3
da diversidade étnica na América do Sul.
Vimos a este Fórum, porque a situação de violação de direitos humanos e
territoriais dos povos indígenas no Brasil se agravou fortemente nos
últimos anos. Contrariamente ao que o Governo brasileiro divulga em
espaços internacionais, relatando uma suposta harmonia entre os povos
indígenas e o estado nacional, temos certeza ao afirmar que a situação
dos povos indígenas no Brasil hoje, é a mais grave desde a
redemocratização do País, seja na quantidade de indígenas assassinados,
seja nas iniciativas de esfacelar nossos direitos conquistados ao sangue
de nossos povos.
Está em curso no Brasil uma série de articulações e iniciativas que
buscam a reduzir, suprimir os direitos dos povos indígenas, reconhecidos
pela Constituição Federal Brasileira e reafirmados por tratados
internacionais, textos normativos, dos quais o país é signatário.
No Congresso Nacional, a bancada ruralista, os representantes do
agronegócio, querem de todas as formas aprovar mudanças nos direitos
constitucionais estabelecidos principalmente nos artigos 231 e 232 da
Constituição Federal. Somam-se as iniciativas de propostas de emendas à
Constituição (PEC) 038 e 215 que pretendem transferir para o Senado e
Congresso Nacional, hoje maioritariamente composto por representantes do
agronegócio, a competência de demarcar as terras indígenas, usurpando
uma prerrogativa constitucional do Poder Executivo.
O modelo desenvolvimentista brasileiro objetiva disponibilizar os
territórios indígenas, e de outros segmentos e comunidades tradicionais,
para a exploração descontrolada dos bens naturais, a expansão do
agronegócio e a implantação de grandes empreendimentos, principalmente
energéticos (hidrelétricas) e de exploração mineral, e obras de
infraestrutura: portos, estradas, linhas de transmissão etc. que
comprometem a sobrevivência e continuidade física e cultural dos povos
indígenas.
Para tanto, o Governo brasileiro paralisou o processo constitucional de
demarcação de nossos territórios, aumentando gravemente os conflitos
territoriais em várias regiões do Brasil. Nunca, em nossa história
recente, vimos tantas lideranças ameaçadas de morte, comunidades
inteiras inclusas em programas de proteção e no caso do estado em que
moro, lideranças assassinadas a luz do dia, e com seus assassinos
impunes. Meu estado concentra a maior quantidade de lideranças indígenas
assassinadas na última década devido a luta pela terra.
Ontem mesmo, uma liderança de meu povo, sr. Paulino, sofreu atentando e
dos vários tiros que foi dado em seu carro, felizmente apenas um acertou
sua perna e segue vivo. No meu estado, pelo menos 20 lideranças
indígenas foram assassinadas na última década devido a suas lutas por
territórios; outros 350 assassinatos no mesmo período resultam do
processo de confinamento de nossos povos em pequenos territórios.
O povo Kaiowá e Guarani em meu estado, diante da falta de suas terras,
contabilizaram desde de 2000 cerca de 690 suicídios, sendo que em 2013
foram 73 casos, o maior já registrado em 1 ano, dos quais 70% eram
jovens.
Diante da inercia do governo, vimos uma cidade inteira se revoltar,
alimentada pela desinformação, pelo racismo, contra o povo Tenharim no
Amazonas.
O povo Tupinambá após vários casos de conflitos e ataques a suas
comunidades, tem seu território militarizado, suas lideranças ameaçadas e
impedidas de denunciar sua realidade.
Trazemos também a situação do Povo Kaingang que semana passada, teve 7
lideranças de seu povo presos no Rio Grande do Sul como resultado de
ações de defesa da comunidade.
Há no Brasil uma virulenta campanha de criminalização, deslegitimação,
discriminação e racismo contra os povos indígenas. Informações
midiáticas são difundidas visando burlar os fatos reais e projetar
inverdades que constituem uma verdadeira inversão de direitos. Na
concepção deles, os povos e comunidades indígenas se constituem em
invasores, subverteres da ordem e principalmente são obstáculos ao
desenvolvimento nacional.
O poder Executivo, por meio do Ministério da Justiça, tem atuado em
convencer o movimento indígena a negociar nossos direitos, propondo
graves mudanças no processo de demarcação de nossos territórios
estabelecidos pelo Decreto 1775/96, tudo em favor dos interesses do
latifúndio, do agronegócio e da reterritorialização do capital sobre as
terras tradicionais dos povos indígenas.
Sobre o processo estabelecido pelo governo para regulamentar a convenção
169 da OIT no Brasil, a APIB se retirou das mesas de negociação porque,
o próprio governo atropelou o encaminhamento publicando a Portaria
303/12, que desrespeita e desqualifica a Convenção e que em suma quer
viabilizar seus megaprojetos em terras indígenas como por exemplo o fez
em relação aos casos das hidro-eletricas Belo Monte e Tapajos, levadas a
cabo sem um processo de consulta.
Para vossa informação, sobre a reunião de alto nível a ser realizada em
setembro conhecida como Conferencia Mundial dos Povos Indígenas, venho
afirmar que os povos indígenas no Brasil só souberam desta iniciativa
este ano, através de um informe rápido que o Governo Brasileiro fez em
reunião da CNPI e que há apenas 1 vaga; não houve por parte do governo
brasileiro a realização de um processo de consulta, de construção
coletiva e o esforço de garantir uma representatividade à altura do
Brasil. Cabe ressaltar que o Brasil abriga 1/3 da diversidade de povos
indígenas na América do Sul.
Face a esse quadro de agressões e regressão nos direitos indígenas,
principalmente territoriais, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
(APIB) recomenda ao Fórum Permanente sobre Direitos Indígenas, o quanto
segue:
1. Que o Fórum Permanente envie urgentemente observadores ao
Brasil para que acompanhem a realidade dos conflitos territoriais,
situação ausente nos relatórios do governo.
2. Que o Fórum urja ao Brasil a retomada do processo
constitucional de demarcação das terras indígenas, cuja paralisação tem
ampliado gravemente os conflitos territoriais. Lamentavelmente o governo
Dilma é o que menos tem demarcado terras indígenas. Portarias de
identificação, declaratórias e Decretos de homologação não tem sido
publicado, mesmo quando estes não possuem impedimentos judiciais,
perpetuando a agonia dos povos indígenas.
3. Que o Fórum realize um Seminário Internacional em conjunto
com o UNODC e UNHRC, sobre a Criminalização dos Povos indígenas e suas
organizações, quando estes defendem seus direitos humanos e
territoriais.
4. Que o documento final da reunião de alto nível em setembro,
conhecida como Conferencia Mundial dos Povos indígenas, caso realizada,
seja contundente quanto a implementação de ações efetivas nas distintas
áreas de interesse dos povos indígenas, principalmente quanto a efetiva
devolução e proteção dos nossos territórios tradicionais.
A APIB acredita que espaços como estes são fundamentais para que nossos
povos tenham vidas melhores e por isso pedimos o apoio dos parentes
indígenas de outras regiões do mundo, convidando-os a se somar conosco
nesta luta pela vida.
Eis o caminho para a construção de uma sociedade realmente democrática, multiétnica, pluricultural e justa.
Brasília – DF, 19 de maio de 2014.
#################################################
Outras informações:
Carolina Fasolo/Imprensa - (61) 9686-6205 / (61) 2106-1670
|
No hay comentarios:
Publicar un comentario